terça-feira, novembro 08, 2005

Um homem poderá dizer: já vi tudo - e o seu tédio pode ser aceite como consequência de um excepcional poder de observação (vê tão bem que já viu tudo); mas se um Homem disser: já pensei tudo – apenas confessa a sua limitação intelectual. Já não é o mundo previsível e limitado que tem culpa do seu tédio, mas é a sua própria cabeça a culpada. Não me aborreço porque o mundo não tem imaginação; aborreço-me porque eu não tenho imaginação.A ficção é, assim, em primeiro lugar, uma iniciativa mental (a literatura que sai da «alma» e de outros órgãos ainda mais improváveis parece cometer o pecado inicial, perdoe-se a expressão, de partir da canalização errada), sendo pois a ficção uma iniciativa mental é, pela própria natureza da sua origem, interminável: podemos tentar contar o número de coisas possíveis, mas nunca poderemos contar, até ao fim, o número de possíveis invenções de coisas muito improváveis ou impossíveis – felizmente para a ficção, infelizmente para nós, morreremos antes.
Gonçalo M. Tavares, Jornal de Letras
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