segunda-feira, novembro 27, 2006

Cesariny

Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco

Mário Cesariny

Houve uma altura, há uns anos, em que andava a ler Cesariny. Näo a ler como quem mergulha num escritor, num poeta. Mas a ler curiosa, a tentar imaginar, levada pelas palavras, o homem de quem me falavam. O homem sem dentes, fumador compulsivo, que fascinava a cada segundo e que obrigava ao silêncio dos jovens na sala. Fascinava pela vida, pela idade e pela presenca. E eu, provavelmente muito nova ou muito longe de um espírito surrealista, fui estranhando palavras e poemas. Fascinada.