segunda-feira, outubro 02, 2006

Acordar de noite*

Parei para pensar, pensar nos meus dias. Apercebi-me que a minha vida adulta comecou aqui. Comecou aqui a minha casa, o meu total controlo dos dias, o poder absoluto sobre o futuro. Comecou uma rotina nova, de que gosto, que fiz nascer. Comecou uma nova cidade, fiz minhas novas ruas, novos espacos. E, quando voltei a acordar de noite, quando os dias voltam a ficar curtos, anunciando o Inverno, percebo que passou (quase) um ano. Um ano de diferencas. E nunca saíram de mim - näo só da memória mas da pele, do presente, dos dias que se esperam - todas as pessoas que ficaram no meu mundo a milhares de kms. Caras que reencontro sempre que volto por uns dias, sorrisos que me väo chegando aqui - alegria dos dias. Parei para pensar. E percebi que cresci.


*O Primeiro poema que li do Al Berto - com que descobri o Al Berto - chama-se Acordar tarde. Hoje pensei na ironia, ou na diferenca. Mas rapidamente (lucidamente) caí em mim: o Al Berto era um poeta, boémio, homosexual num Portugal conservador e retrógado, dedicado aos prazeres da noite. Eu sou uma morning person entregue à ciência no norte da Europa. Here you go.

1 Comments:

At 1:16 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Este post merecia uma grande conversa. Chegar a adulto é muito difícil. Dói, arde. Às vezes, pelo meio, até deprime. Mas é bom. Muito bom. Pelo menos eu, que me sinto a chegar aí, a começar a vislumbrar a definição de um "eu" de corpo inteiro, definido, em paz comigo e com a minha história, senhor do barco que navego, já percebi isso. Gostei da tua frase "o meu total controlo dos dias, o poder absoluto sobre o futuro", de quando falas da rotina que fizeste nascer. Gosto da tua consciência do crescimento, da maneira como te olhas e te vês. Só há um problema. É que o controlo de que falas não é total. Aliás, está mesmo muito longe disso. Para o bem e para o mal. Não controlamos o amor nem o mal dos outros (enquanto vamos tentando controlar o nosso). Contudo, e dando-te, em última análise, toda a razão, a verdade é que, num certo sentido, os controlamos. Ou antes... controlamos os seus efeitos. É na medida em que não fazemos depender a nossa felicidade do mundo exterior, do que nos sucede, do que nos fazem, que ganhamos liberdade. Trata-se da consciência (consciência de uma forma que não é racional mas antes vivenciada, emocional quase) de que a nossa felicidade assenta na perspectiva última que temos da existência (religiosa ou não), no prazer de viver e de sermos pessoas no mundo, no amor que damos. É, ao fim de contas, um pouco da dimensão espiritual da vida. Ser adulto é, assim, num certo sentido, a paz com os afectos e com as memórias. Mas, mais ainda, o investimento afectivo que fazemos, o amor que decidimos pôr nas coisas e nos outros. Escolher o que somos implica escolher aquilo que amamos. Quando esta liberdade de amar nos traz a paz, quando o nosso eu vive com prazer o que é, aí... crescemos!
Parabéns. Estes dias são melhores que mil aniversários.

Ah... e já agora. Tens um bonito vestido verde...

 

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